Sou Advogado, o Blog foi criado para tratar de temas do mundo Jurídico, Criticas, Organização do Estado e tudo que afeta diretamente a sociedade, também haverá assuntos sobre tecnologia e atualidades, espero que gostem.

O NOVO ESTATUTO LEGAL DOS CRIMES SEXUAIS: DO ESTUPRO DO HOMEM AO FIM DAS VIRGENS...

O NOVO ESTATUTO LEGAL DOS CRIMES SEXUAIS: DO ESTUPRO DO HOMEM AO FIM DAS VIRGENS...
Em 10 de agosto de 2009, foi publicada a Lei n. 12.015, de 07 de agosto do mesmo ano, que entrou em vigor na data de sua publicação e modificou o conteúdo do título do Código Penal dedicado aos crimes contra os costumes – agora crimes contra a dignidade sexual.
Há modificações que resolvem, de uma vez por todas, temas que geravam controvérsias. As mais relevantes são: a alteração do tipo penal de estupro, inovando com a possibilidade de o homem figurar como sujeito passivo e abrangendo, na mesma figura, a conduta antes definida como crime de atentado violento ao pudor, a revogação da presunção de violência e, em contrapartida, o surgimento de tipos penais autônomos para vítimas agora tidas como vulneráveis, a mudança da regra geral relativa à espécie de ação, de privada para pública condicionada, e o segredo de justiça para todos os crimes contra a dignidade sexual.
Poucos dispositivos foram revogados, apenas quatro, mas em número maior foram as alterações - que atingiram desde a denominação do título, capítulos e crimes, até o conteúdo de artigos e parágrafos – e as inclusões de novos artigos, num total de seis: 217-A, 218-A, 218-B, 234-A, 234-B e 234-C, e de novos parágrafos para os artigos preexistentes, que trouxeram figuras qualificadas e, principalmente, várias causas de aumento de pena.
A nova lei atingiu praticamente todo o título dos antes chamados crimes contra os costumes. O único capítulo isento de alterações e que, aliás, mantém a redação original de 1940, que lhe foi dada quando da promulgação do Código Penal, salvo quanto ao valor da multa, é o VI (Do ultraje público ao pudor).
A Lei dos Crimes Hediondos também foi atingida pela nova lei, que incluiu a hediondez do crime de estupro simples.
As novidades atingiram não só o conteúdo dos dispositivos, mas também os nomes de título e capítulos. A primeira delas vem logo no título. Abandona-se a conhecida intitulação Dos crimes contra os costumes para adotar-se a denominação Dos crimes contra a dignidade sexual. Não se vê razão aparente para a mudança, a não ser um desejo de se harmonizar o título com a Constituição de 1988, que traz como fundamento da República a dignidade da pessoa humana (art. 1°, III).
Dois dos seis capítulos que compõem o título – considerada a recente revogação do Capítulo III (Do rapto) – tiveram alteração de nomenclatura.
O Capítulo II, cujo conteúdo foi totalmente alterado, não mais trata da sedução e da corrupção de menores. É agora denominado Dos crimes sexuais contra vulnerável.
E o Capítulo V, antes Do lenocínio e do tráfico de pessoas, teve inserido, já no título do capítulo, um elemento subjetivo do tipo: para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual.
O objetivo deste trabalho é apontar as inovações da nova lei e fazer uma breve análise das suas principais conseqüências.
O ESTUPRO E SEUS SUJEITOS PASSIVOS (O HOMEM ENTRA EM CENA...)

Interessante modificação envolve a definição legal do crime de estupro, que se mantém no art. 213 do estatuto penal, conserva a mesma rubrica, mas sofre importantes alterações. A infração passa a abranger, numa mesma figura, não só a conduta de constranger alguém – e não mais somente a mulher – à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça, como também aquela conduta antes inscrita no tipo descrito no revogado art. 214 (atentado violento ao pudor). Tornou-se solucionável, e típica, aquela acadêmica e hipotética situação em que um homem, mediante violência ou grave ameaça, fosse constrangido à conjunção carnal. Inexistia tipo penal adequado a tal conduta, pois inaplicável o antigo art. 214, já que não se tratava de ato diverso da conjunção carnal e, sim da própria conjunção carnal; e era igualmente inaplicável a anterior figura do estupro, que exigia que o constrangimento fosse contra mulher.
Essas mesmas alterações impostas ao crime de estupro e atentado violento ao pudor estendem-se aos antigos crimes de posse sexual mediante fraude e atentado violento ao pudor mediante fraude. As condutas nesses dois tipos penais previstas passam a constituir, juntas, um único tipo penal, o mesmo da antiga posse sexual mediante fraude (art. 215), mas com outra definição legal: violação sexual mediante fraude, e têm como sujeito passivo não mais somente a mulher e sim alguém, tudo conforme a nova redação do citado art. 215.


FIM DA PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA E O SURGIMENTO DO VULNERÁVEL

A revogação da presunção de violência (art. 7° da Lei n. 12.015/09) é outra novidade. Não mais se presume a violência em relação a vítimas menores de 14 anos, àquelas que o agente saiba alienadas ou débeis mentais, ou que não possam oferecer resistência.
Preferiu o legislador que situações semelhantes fossem tratadas com mais severidade e, para tanto, criou tipos penais autônomos, estipulando para eles penas maiores.
Passa-se a chamar de vulneráveis os que tenham 14 anos ou menos e aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tenham o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não possam oferecer resistência.
O estupro praticado contra o vulnerável é uma nova infração, cuja conduta está inscrita no art. 217-A e é apenada com reclusão de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
A nova redação aparentemente encerra discussões, iniciadas com um julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, no qual o ministro Marco Aurélio adotou o entendimento de que a presunção de violência do art. 225, a, do Código Penal, quanto a vítimas com menos de 14 anos, era relativa, e que, portanto, permitia prova em contrário. O enunciado lacônico do art. 217-A traz implícita a irrelevância do consentimento do ofendido quanto à prática da libidinagem: crime haverá mesmo com tal consentimento.
Por outro lado, a lei agora não fala mais na necessidade de conhecimento, pelo ofensor, da defasagem mental do ofendido (na redação anterior que tratava da presunção de violência, era expressamente previsto, como elementar do tipo, que o agente soubesse da alienação ou debilidade mental da vítima). Mas tal condição, embora não tendo sido acolhida textualmente pelo novo tipo penal (estupro de vulnerável), segue sendo necessária para a configuração do crime, posto que integrante do dolo do agente; em conseqüência, caso este não tenha conhecimento da vulnerabilidade da vítima – quer no caso de enfermidade ou deficiência mental, quer nos demais previstos no art. 217-A, caput e parágrafo primeiro - incorrerá em erro de tipo, que afastará, por ausência de dolo, a incidência dessa figura típica (CP, art. 20, caput).
Ao afastar a presunção de violência e estabelecer um tipo próprio, no qual a idade, a enfermidade ou deficiência mental da vítima e a impossibilidade de que ofereça resistência constituem elementares, e para o qual são fixadas penas maiores, estabeleceu sem dúvida o legislador maior severidade no trato do assunto.


NOVATIO LEGIS IN MELLIUS (E AS VIRGENS SAEM DE CENA...)

A revogação (art. 7°) do tipo legal do atentado violento ao pudor (com a inclusão da conduta antes nele inscrita na atual figura do estupro), da forma qualificada da posse sexual mediante fraude, assim como o abrandamento da pena para o crime de tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual, são exemplos de novatio legis in mellius trazidos pela nova lei. Beneficiados serão os condenados por este último crime, em vista do abrandamento da pena, antes de três a oito anos de reclusão, e atualmente de dois a seis anos. Para os eventualmente condenados, ou processados, por atentado violento ao pudor e estupro, cometidos no mesmo contexto e contra a mesma vítima, a maior benignidade da nova lei é evidente: como o tipo do estupro passa a conter indistintamente aquelas duas condutas, haverá crime único, afastada, de vez a possibilidade de concurso, material ou formal.
Por fim, dando seqüência às inovações advindas com a revogação dos tipos penais da sedução, cuja vítima era a mulher virgem, e do rapto, que tinha como vítima a mulher honesta, a nova lei elimina, agora, a forma qualificada do crime de posse sexual mediante fraude (que muda de rubrica), também ligada à virgindade da vítima. Nela, aquele que tivesse conjunção carnal, mediante fraude, com mulher virgem, ou menor de 18 e maior de 14 anos, receberia pena mais grave que a prevista para o crime em sua forma simples. Hoje não mais, passando a existir cominação de pena de multa, aplicável cumulativamente, se a finalidade do agente for a obtenção de vantagem econômica. É outro caso, portanto, de novatio legis in mellius. Para o caso da posse sexual mediante fraude qualificada, tendo sido o delito cometido contra mulher virgem ou maior de 14 e menor de 18 anos, condições que, hoje, não qualificam o crime, será o agente beneficiado pelo abrandamento da pena agora imposta ao crime de violação sexual mediante fraude.
A revogação da forma qualificada do crime de posse sexual mediante fraude e a alteração da pena do crime de tráfico interno de pessoa para fins de exploração sexual podem levar, ainda, a um novo cálculo da prescrição, de efeito retroativo, e, em conseqüência, à extinção da punibilidade do agente (art. 110, §§ 1° e 2°, do CP), mesmo que, condenado, esteja em cumprimento da pena, porque o trânsito em julgado não obsta a retroatividade da lei penal mais benigna.
Esses possíveis problemas, estando o réu já condenado definitivamente, deverão ser resolvidos pelo juízo das execuções, que será o competente para fazer as necessárias adaptações, quanto à pena e às circunstâncias que influem na sua dosagem (art. 66, I, da LEP, e Súmula n. 611 do STF). Na hipótese de a pena anteriormente aplicada ser superior à mínima, o juiz da execução deverá utilizar os mesmos critérios de dosimetria do juízo do conhecimento, só que tomando como base do cômputo o novo mínimo legal.

Leave a Reply

Deixe seu Comentário